Conceito pouco conhecido no Brasil, a coparentalidade já foi tema de telenovela da rede Globo. Trata-se de um novo formato familiar que discretamente vem ganhando espaço na sociedade brasileira. De modo superficial, a coparentalidade é quando dois adultos que não possuem um vínculo romântico decidem gerar, criar e educar um filho juntos, compartilhando assim a experiência de construir uma família sem necessariamente estabelecer um laço amoroso.
Ao primeiro contato, o conceito causa certo estranhamento e pode até assustar. A verdade é que ninguém está pronto para o que o espera no futuro, todos estão acostumados a crer e esperar que as coisas vão simplesmente acontecer no tempo certo, que vai haver um momento em que o parceiro ideal vai aparecer, as borboletas no estômago vão voar, os sinos da igreja vão tocar e a família naturalmente se construirá. E quando o tempo chega e nada disso acontece? E quando a vida se estruturou, quando a situação financeira se estabilizou e o amor não chegou? A mãe natureza foi implacável com as mulheres e lhes deu um prazo para exercer a maternidade. Muitas se veem beirando os 40 sem o menor vislumbre de um parceiro confiável, sem a sombra de um relacionamento e a ideia da menopausa iniciando sua assombração insistente; o tique-taque do relógio ali, relembrando que o dom da maternidade tem prazo de validade. Para as mulheres que vivem este drama e são avessas à adoção ou produção independente, a coparentalidade se tornou uma das soluções.
No Facebook existe um Grupo Fechado chamado “Coparentalidade Responsável e Planejada”, que foi criado com o intuito de aproximar homens e mulheres que pretendem formar uma família através da coparentalidade. Hoje o grupo conta com 1.243 participantes, entre curiosos e engajados na busca, pessoas de todas as idades, orientação sexual, credo, estados, etc.
Segundo a idealizadora do grupo, em entrevista exclusiva à Revista A Empreendedora, o grupo nasceu de sua própria jornada pessoal em busca de realizar o sonho da maternidade:
“Um dia do primeiro semestre de 2014 eu digitei no Google “ser mãe sem casar” e encontrei dois artigos sobre o assunto, escritos e publicados por um sexólogo e um advogado no ano anterior. Então pensei um pouco e criei uma fanpage “Faça um Filho Comigo”, para tratar do assunto e, porque não, encontrar o pai ideal para o meu filho e ajudar outras pessoas também a encontrarem seus parceiros de parentalidade.”.
Ao longo destes anos que mantém a página, ela explicou que se aprimorou sobre o assunto, fazendo diversas pesquisas, inclusive buscando consultoria jurídica sobre o tema. Os membros além do contato pelo Facebook, podem fazer parte de grupos de Whatsapp, administrados pela idealizadora da página do Facebook, desde que sigam as regras, também estabelecidas por ela. Qualquer sinal de rompimento das regras ou de má intenção por parte de algum membro, acarretam a retirada imediata do membro das redes sociais mencionadas. Ou seja, o intuito é que se mantenha a seriedade dos grupos e se evite a banalização.
Quando a idealizadora do grupo é questionada sobre a sua concepção de coparentalidade, a resposta é detalhada:
“Na minha concepção e desejo, a coparentalidade é uma nova configuração familiar onde um filho será desejado, planejado, concebido, amado, criado, educado por dois pais que não tem um vínculo entre si conjugal. É uma nova configuração familiar cada vez mais procurada por gays, lésbicas, bissexuais e assexuais. Também encontramos heteros que por “n” motivos não querem se relacionar afetivamente com os pais de seus filhos. No caso de mulheres, muitas delas já passaram por um ou vários relacionamentos abusivos e não querem mais se envolver afetivamente. Ou há aquelas que estão em uma idade mais difícil de engravidar que passam a dar prioridade à realização do sonho da maternidade, deixando para depois a procura por um novo amor. (…) A ideia da coparentalidade não é acabar com a família tradicional brasileira, mas sim dar uma alternativa a quem não se enquadra neste “padrão”. Muita gente, por não querer casar ou por ser homossexual, acaba abrindo mão do sonho de ser mãe ou pai. Essa seria uma alternativa para que essas pessoas realizassem seus sonhos e para que crianças possam vir ao mundo amadas e planejadas com responsabilidade, com a certeza absoluta que receberão uma educação despida de preconceitos, ao menos, muitos deles”.
Em conversa informal entre as garotas do grupo fica óbvio que homossexuais e assexuais são os candidatos preferidos e ideais, por razões de familiaridade comportamental e de afinidade emocional. As mulheres creem que estes dividirão a tarefa com mais responsabilidade e igualdade, cuidando do filho na mesma proporção e não apenas atribuindo esta responsabilidade à genitora. No entanto, os heterossexuais não estão descartados por elas, desde que se adaptem às regras. Sendo uma das primordiais: o objetivo não é sexual, então, evita-se a paquera.
Quando o homem e a mulher entram em acordo, eles “fecham a parceria”. Neste caso, o método mais indicado e adotado pelos integrantes deste grupo específico para tentar a gravidez é a inseminação caseira.
Quando se trata de coparentalidade, não se deve julgar e adotar nenhum rótulo, imaginando que apenas as mulheres com idade mais avançada tomam a decisão de optar por este formato familiar. A carioca X*, integrante do Grupo, tem 20 anos. Ao ser questionada sobre os motivos que a fizeram optar pela coparentalidade, ela foi incisiva:
“Optei pela coparentabilidade, pois meus relacionamentos foram todos sem sucesso e o sonho em ser mãe falou mais alto”.
Ela explica ainda que a busca por um parceiro tem sido calma e tranquila, mas reclama que os homens do grupo não possuem muita iniciativa. Quanto às dificuldades e benefícios da coparentalidade, ela diz:
“A maior dificuldade é ter que conhecer e tentar entender o futuro pai do seu filho. O benefício é que você não corre tantos riscos de um pai de pracinha, um pai que rejeitará seu filho, pois ambos estão em busca dos mesmos ideais que é o bebe”.
A baiana C*, 37 anos – já de parceria formada – compartilhou um pouco da sua jornada e dificuldades enfrentadas, antes de finalmente poder iniciar a fase de tentar a concepção. No momento, ela e o parceiro estão na fase de “tentar engravidar”, ele mora em outro estado e viajou até a Bahia para fazerem a inseminação caseira, durante o período em que ela está fértil. Ela conta que optou pela coparentalidade porque não encontrou nenhuma relação em que tivesse um vínculo seguro o suficiente para ter filhos, da mesma forma nenhum dos homens com quem se relacionou demonstrou interesse similar, só queriam “curtir a vida”. Ela disse que chegou a ouvir de um namorado que se ela engravidasse teria que se preparar para fazer um aborto, porque ele não estava pronto para ser pai. Estas relações acabaram por traumatizá-la e desencorajá-la de tentar ter filhos por meio de um relacionamento amoroso. Por esta razão, o sonho de ser mãe a conduziu a buscar a coparentalidade e ter um filho com alguém que tivesse o mesmo propósito e desejasse fazer tudo de forma responsável. Ela passou nove meses em diálogo com o homem que hoje é seu parceiro de coparentalidade, sua família o conheceu e simpatizou com ele. Entraram em acordo sobre aspectos da criação da criança, especialmente, devido à distância e aspectos financeiros, já que na coparentalidade os gastos são divididos de modo equilibrado entre ambos. Agora o que falta para eles é apenas o sonhado positivo.
O mais importante sobre a coparentalidade é compreender que são duas pessoas conscientes que buscam, juntas e premeditadamente, a realização de um sonho: ter um filho.
Se quiser saber mais, visite a Fanpage:
https://www.facebook.com/coparentalidadeResponsavel/
*Os nomes foram omitidos para manter a privacidade das entrevistadas.
Rândyna da Cunha [email protected] http://lattes.cnpq.br/7664662820933367 http://www.asomadetodosafetos.com/author/randyna-da-cunha Instagram @randyna twitter @randynadacunha