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Amor

Conto: Amor impossível

A garota que eu amo…

Conheci uma garota num sábado à tarde.

Quando a vi, me encantei com o jeito dela, andar leve, olhar meigo, cabelos esvoaçantes balançando a cada passo dado por ela. Paixão à primeira vista?

Passei a pensar nela, tudo que fazia ou via me lembrava aquele rosto lindo. Com o tempo passei a senti-la, como se estivesse ao meu lado. Era amor.

Sou um garoto do interior, filho de pais separados, aliás, nem cheguei a conhecer o meu pai, sabia quem era somente pelas fotos que minha mãe me mostrava. Nem sabia se ainda seria assim.

Ele nos deixou ao saber que minha mãe estava grávida. Desapareceu sem deixar notícias, para onde foi, o que foi fazer, enfim, minha mãe lutou muito para me colocar ao mundo.

Hoje, sou crescido, graças ao esforço de minha mãe, pois a pensão que ela recebia mal dava para os meus estudos. Demais despesas ela precisava trabalhar muito, para poder dar um mínimo de conforto.

Não posso reclamar, pelo menos ele pagou o meu estudo até me formar na faculdade, saí para a capital para estudar na universidade federal, mas o alojamento ele pagou até me formar.

Quando recebi uma carta de minha mãe, com a petição no juiz onde meu pai pede exoneração nos pagamentos de pensão, por eu ter atingido maioridade e formado na universidade, nem acreditei. – Cretino! – Foi a primeira coisa que pensei.

Pois, ainda me faltava arranjar um emprego, porque me formar não me garantiria um emprego de imediato, e até voltar a morar com minha mãe que se casara novamente ficava difícil. Eu conseguia trabalhos temporários, graças ao senhorio que se simpatizara por mim.

Eu me sentia um fardo para minha mãe.

Os dias de Outono fazia muito frio com ventos cortantes, parecendo lâmina no rosto, mas aquele dia estava diferente, um raio de sol entrava pelo vidro, das frestas das persianas fechadas.

Eu ainda convalescia de uma pneumonia adquirida pelas noites mal dormidas, para fazer trabalhos escolares, estudar para as provas e defender tese.

Estava na janela, desolado, sem forças, mas então vi um sol radiante, abri as persianas e o calor era contagiante, várias pessoas passeando na praça de frente da minha janela, com seus filhos, seus cachorrinhos e então decidi descer para tomar um pouco de sol.

Me agasalhei e saí, uma roupa amena e um suéter com cachecol. O vento ainda estava lá, não podia correr o risco de um resfriado, pois ainda não estava de todo curado.

Não sou frágil como pensam, sou até bem-apessoado, corpo atlético, malho regularmente, sou um aspirante ao esporte da natação. Ainda um amador.

Sentei-me num banco vazio, o que achei uma sorte, já que a praça estava cheia de gente, estava apreciando o movimento quando sinto um perfume suave e adocicado e me viro, meus olhos fixaram naquela pessoa, linda o rosto me parecia familiar, mas não a conhecia.

Sei que senti atração de imediato. Ela veio andando como se flutuasse, tão leve, cabelos ondulados batendo nos ombros, e vinha na minha direção. Fiquei corado quando ela se vira para me fitar os olhos, sorrindo.

Tinha uma tonalidade violácea, mudando para um azul petróleo, diferente de todos os olhos que já havia visto. Então ela se senta no mesmo banco.

Aí se abaixa para pegar uma cesta que estava debaixo do banco. Eu não havia percebido quando me sentei, agora ela está abrindo a cesta e retirando a toalha para forrar o resto do banco entre nós, já falando:

  • Vim munida para um piquenique, mas levei “um bolo” de minha amiga, marcamos para nos encontrar aqui, e ela não veio, fui dar uma volta para ver se a encontraria, mas ela ligou informando que ocorreu um imprevisto. Portanto, aqui estou com essa cesta cheia de guloseimas.

Dito isso, ela foi retirando o que havia na cesta, oferecendo para compartilhar comigo.

  • Desculpe, nem me apresentei, sou Melissa, moro na capital desde que nasci, e você?
  • Jason, vim para a capital estudar – falo meio rouco, pois, minha voz saiu embargada, de emoção. Nesse momento eu já estava de quatro, literalmente, paixão à primeira vista.

“A paixão é um sentimento avassalador, não escolhe o momento e nem pessoa, local então nem se fala, simplesmente explode no interior, trazendo à alma e ao coração, um calor jamais sentido”.

Ela me olha num jeito estranho, e pediu:

  • Qual seu sobrenome?
  • Xavier, respondo.

Estranho mesmo ela pedir meu sobrenome, mas, como pareceu satisfeita fiquei quieto.

Comemos os sanduíches e bolo, suco, barras de chocolate como sobremesa. Tudo em silêncio.

De repente me deu vontade de me abrir, então passei a contar sem sentir:

  • Foi meu pai que escolheu esse nome, desde que eles namoravam ele dizia que se tivesse um filho gostaria que se chamasse assim, e quando minha mãe ficou grávida, ela disse a ele, e sem que esperasse foi abandonada, ele sumiu e nunca mais apareceu.
  • Mas, quando eu nasci, ele começou a enviar depósitos que o juiz determinou como pensão, o que minha mãe estranhou, pois ela o informava sobre a gravidez, e até quando soube que esperava um garoto, minha mãe disse a ele – será Jason. Ele nunca respondeu às cartas que ela escrevia e endereçava para a fábrica onde ele trabalhava.
  • Agora me formei, então a pensão parou de vir. Estou quase em apuros, pois as economias estavam se acabando e estou de licença, por causa da pneumonia.

Ela escutou em silêncio. Logo ajeitou tudo dentro da cesta, para se despedir. Então eu peço que ela me acompanhe para que ela conheça onde moro.

Ela me seguiu em silêncio e subiu as escadas. Eu morava numa sobreloja, lá tinha quatro quitinetes, onde moravam um casal, um senhor separado, um estudante e eu.

Minha casa consistia em uma sala grande, um banheiro, uma cozinha pequena e quarto que era parte da sala. Janela grande, que arejava o ambiente. Meus pertences eram de livros, algumas medalhas de competição amadorística, e uma arara de roupas. Uma mesa e cadeira.

Camas e demais eletrodomésticos eram de propriedade do locador que também era dono da loja debaixo. Não tinha vaga de garagem, então quem morasse lá, não podia ter carro.

Ela olhou tudo, e logo se despediu prometendo voltar.

A partir de então, eu passo a sonhar com esse dia, e tudo que faço é pensando nela, até meus sonhos eram dela.

Só de pensar nela, idealizando um futuro juntos, melhorei a minha performance na natação, sendo visto pelos olheiros que me convidaram a participar de regionais, e ganhara até um patrocinador que me enviava roupagens de marca, com logotipo dele, e assim passaram-se dois anos.

Eu disputava a semifinal, se eu conseguir chegar na final, seria chamado para as Olimpíadas.

Quero muito participar das Olimpíadas, quero a medalha de ouro, é uma meta para poder merecer o amor dela. Quero estar pronto, para esse dia, ela terá orgulho de mim.

Estou morando num apartamento melhor, mais centralizado com vista linda da sacada, para uma praça, com chafariz. Prezo muito essa paisagem.

Mas, mantive a quitinete em dia, pois era ali que a Melissa procuraria, seria um ponto de encontro, e o senhorio estava avisado, quando ela me procurasse, ele me ligaria e eu viria correndo. Ela nunca me procurou.

O grande dia chegou, estava nas Olimpíadas, queria dar o meu melhor. Nem percebi quando entrei na água e quando cheguei no final, estava no podium, cheguei na frente, bati o recorde.

Ouro – pensei feliz, quando recebi a medalha e o troféu, nem acreditei. Estava tão eufórico, sorri para as fotos, e corro o olhar para a multidão, procurando alguém especial, minha mãe.

Essa mulher vale mais que o ouro que recebi hoje, sempre me apoiou, torceu e incentivou.

Vi uma miragem à minha frente, um raio de sol iluminou a minha visão, ela estava lá, logo atrás de minha mãe, abraçada num senhor. Sorrindo para mim.

Meu coração errou o compasso, faltou ar nos meus pulmões, senti um aperto na alma.

Estava chorando sem perceber. A emoção de vê-la foi tão forte. Minha mãe aplaudia e sorria também.

Levantei o troféu, e fui correndo na direção dela, abracei e chorei mais, logo Melissa veio até mim, sempre abraçada no senhor. Minha mãe olha para trás e leva um susto, reconhece o senhor sorridente.

Vou ao vestiário confuso, deixando-os para trás, tomo uma ducha gelada para refrescar a memória e a emoção, me visto e saio para me encontrar com eles, quero esclarecer tudo.

Meu coração não para de bater forte, mal sinal.

Quando chego até eles, descubro através de minha mãe, que ele é meu pai, só não entendi a ligação dele com a Melissa.

Minha mãe então chama a Melissa pelo nome e me apresenta como minha irmã. – Irmã???

O meu mundo se quebrou em mil cacos.

Chorei outra vez, um desespero tomando conta de mim. Olho para meu pai, ele abaixa o olhar, sem nada falar. Cretino… Meu pensamento foi crucial, então corri sem ver para onde estava indo. Deixei todos para trás. Meu mundo, quero que fique aí, no passado.

Como pode ser isso?

Eu a amo há tanto tempo, minha paixão, meu mundo, meu amor.

A pessoa que me dava impulso para seguir em frente – era minha irmã.

A verdade que, ao deixar minha mãe para trás ele não confessou que já era casado, conheceu minha mãe, uma pessoa meiga e compreensiva, no meio de tumulto que era a vida dele de casado, teve momentos de paixão, sem consequências, e quando se viu encurralado na situação de ser pai, sendo ele casado ainda, ele fugiu para o colo da esposa.

Em seguida, soube que a esposa estava também grávida, tendo a filha, esqueceu de contar para minha mãe, vindo a apresentá-la somente agora.

Quero seguir em frente, esquecer, mas está tão difícil.

A garota que eu amo é minha irmã.

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Heloísa Kishi

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