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A última bolacha do pacote. Sério?

Em tempos tão corridos, quem nunca usou alguma expressão corriqueira, o chamado cliché? Mas quantos de nós efetivamente paramos para pensar na coerência de algumas dessas expressões?

Quantas “últimas bolachas do pacote” você encontrou que estavam verdadeiramente inteiras e com recheio perfeito? Então o que faz o criador e seus fiéis reverberadores¹ desta expressão achar que há algo de positivo em ser a última bolacha do pacote? E isto só piora quando contraposto ao outro dito popular “quem come o último não casa”.

Igualmente, há algum tempo observa-se o retorno da expressão “Sério?”, com o costumeiro uso feito de modo mecânico, sem a devida atenção ao que foi relatado pela outra parte fazendo surgir, assim, o choque de alguém perguntando “Sério?” após uma informação negativa ou triste.

Você ri? Pois lhe digo que isto aconteceu comigo quando fui à agência bancária onde meu pai possuía conta e, ao informar seu óbito à gerente de sua conta, esta me devolveu um “Sério?”. Conseguem imaginar a dimensão da situação constrangedora e a minha reação sobre sua comunicação?

É fato que qualquer idioma é um sistema dinâmico e que certos conceitos, especialmente relacionados à clichés e gírias, são alterados e até mesmo perdem validade sem que, necessariamente, haja um registro histórico ou uma razão lógica para tal.

Tomemos a palavra “formidável” à qual, várias gerações – inclusive a presente – têm como algo excepcionalmente bom ou muitíssimo bem feito. No entanto, com origem no Latim, FORMIDABILIS, significa “pavoroso, diabólico, horrendo, assustador, o que causa medo, terrível”, derivado de FORMIDARE, “temer”, e de FORMIDO, “temor, terror, medo”².

Como exemplo mais próximo, podemos citar a expressão “sinistro” que, enquanto na área de seguros identifica algum dano ocorrido ao bem material, no âmbito da gíria saiu de um conceito negativo semelhante ao “assustador” ou “tenebroso” para sua versão mais positiva entre os jovens de algo ou alguém “muito bom”, “irado” (outro que se transformou!), “excelente”, “além das expectativas”.

Observa-se que a análise destas mutações, por assim dizer, esclarece parte do chamado generation gap (distância, espaço entre gerações) no que se refere também à comunicação. Mas para, além disso, à distância – por vezes enorme – entre uma resposta como “Já vai.”, “Já faço.”, “É só um minuto.” e o tempo em que a ação efetivamente ocorre… se ocorrer, gera situações que podem suscitar um sem-número de desentendimentos e até prejuízos.  

Caso tenha se identificado em alguma destas situações ou lembrado de outras, não se preocupe em demasia, mas fique atento, afinal qualquer idioma é um sistema dinâmico e se há uma característica específica da raça humana é a de adaptação de fala ou situação conforme sua necessidade. Ainda assim, vale ficar alerta para não fazer vítimas ou ser vítima de expressões vazias, sem nexo ou até mesmo contraditórias e, consequentemente, evitar possíveis constrangimentos ou situações mais desagradáveis que, em termos de negócios, não raro geram reuniões e mais reuniões para definir o óbvio e resolver ingerências comunicacionais ao invés de primar pela busca de bons resultados.

Fechou?

 

Ruth Rapaport

Referências:
[1] Objetos ou pessoas que meramente refletem ou reproduzem uma imagem ou informação recebida, sem questionar, sem analisar.
[2] http://origemdapalavra.com.br/site/palavras/formidavel/

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Ruth Rapaport

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