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A lateralidade manual

A Lateralidade Manual na Investigação Criminal: Aspectos Periciais

Como a lateralidade manual influencia a interpretação de cenas de crime e perfis criminais

A influência da lateralidade manual, ou dominância manual, é um fator frequentemente subestimado nas investigações criminais.

No entanto, sua influência na execução de crimes e na interpretação de cenas criminais é significativa.

A percepção de uma cena do crime é altamente subjetiva, e a lateralidade pode ser um aspecto-chave para evitar erros na interpretação de evidências.

Neste artigo, exploro de que maneira a neurociência e o estudo da lateralidade podem auxiliar na construção de perfis criminais mais precisos, contribuindo para o esclarecimento de crimes.

A lateralidade manual, que inclui tanto destros quanto canhotos, está profundamente conectada com a organização cerebral.

Estudos neurocientíficos demonstram que a dominância de uma mão sobre a outra está relacionada com diferentes hemisférios cerebrais, o que influencia desde a coordenação motora até a percepção e execução de tarefas complexas.

Na perícia criminal, compreender essas nuances pode ser a chave para uma interpretação mais apurada das cenas de crime.

Do ponto de vista neurobiológico, o hemisfério esquerdo do cérebro, que controla a mão direita, está associado a funções linguísticas e analíticas, enquanto o hemisfério direito, que controla a mão esquerda, está mais relacionado à criatividade e processamento espacial.

Embora isso possa parecer distante das investigações forenses, as implicações dessas diferenças no comportamento motor e na percepção espacial do criminoso são críticas para a análise de vestígios deixados na cena de um crime.

A lateralidade pode impactar a forma como um crime é cometido e os vestígios deixados no local. Padrões de golpes com armas brancas, o uso de armas de fogo e até o manuseio de ferramentas podem fornecer informações sobre a mão dominante do agressor.

Destros e canhotos agem de maneira diferente, o que pode ser observado em aspectos como:

Posição dos golpes: Um destro geralmente ataca ou golpeia a partir da direita, enquanto um canhoto o faz pela esquerda. Isso pode ser observado em lesões em vítimas, indicando a posição do agressor no momento do ataque.

Posicionamento do corpo: O ângulo de ataque ou de disparo pode ajudar os peritos a determinar a lateralidade do criminoso. A forma como o corpo do agressor se posiciona em relação à vítima ou aos objetos da cena pode criar um padrão específico.

Manchas de sangue e deslocamento: A direção e dispersão das manchas podem revelar a mão dominante do agressor.

Esse aspecto é amplamente estudado na análise de padrões de manchas de sangue (Bloodstain Pattern Analysis – BPA), que usa a direção e a origem das manchas para inferir o movimento e posição do autor durante o ato criminoso.

Além dos aspectos físicos da cena do crime, a lateralidade também pode influenciar o comportamento cognitivo e emocional do criminoso. Pesquisas na área de psicologia e neurociência sugerem que há uma correlação entre a lateralidade manual e traços de personalidade.

Indivíduos canhotos, por exemplo, apresentam uma maior propensão a diferenças no processamento emocional e podem desenvolver estratégias cognitivas distintas de destros.

Essa variável pode, de maneira sutil, refletir-se na forma como crimes são planejados e executados, o que impacta diretamente a análise de perfis criminais.

Em alguns casos, criminosos tentam deliberadamente enganar a perícia ao simular o uso da mão contrária à sua dominante, na tentativa de confundir os investigadores e evitar a detecção de sua verdadeira identidade.

Contudo, a análise forense especializada frequentemente identifica essas tentativas de manipulação, já que a lateralidade manual é um aspecto profundamente enraizado no comportamento motor humano, sendo difícil mascará-la completamente.

Quando um agressor tenta usar a mão não dominante para cometer um crime, o movimento e a força aplicada tendem a ser inconsistentes, deixando vestígios que podem ser analisados pela perícia.

Por exemplo, ao utilizar uma arma branca, a falta de coordenação fina ao realizar o ataque pode ser refletida na profundidade e no ângulo dos ferimentos.

Golpes realizados com a mão não dominante podem apresentar menos precisão e força, resultando em lesões superficiais ou com trajetória atípica, comparadas aos padrões observados em ataques realizados com a mão dominante.

Esses detalhes, muitas vezes imperceptíveis a olho nu, podem ser revelados por uma análise minuciosa da cena de crime, evidenciando a tentativa de simulação.

No caso de armas de fogo, disparos feitos com a mão oposta à dominante podem apresentar desvios sutis na trajetória do projétil, devido à dificuldade de controle do braço e da postura corporal inadequada ao uso da mão não dominante.

Além disso, a pressão exercida sobre o gatilho, a forma de segurar a arma e o posicionamento do corpo em relação ao alvo são outros elementos que podem trair a verdadeira lateralidade do agressor.

A análise balística pode ser determinante para a identificação dessas inconsistências, auxiliando na reconstrução precisa dos eventos.

Além dos vestígios físicos, as tentativas de manipulação da lateralidade podem ser observadas na forma como os criminosos interagem com objetos na cena do crime.

Por exemplo, impressões digitais ou marcas de mãos deixadas por criminosos que tentam enganar os investigadores com o uso da mão não dominante podem apresentar diferenças na força aplicada ou no ângulo de contato, devido à falta de familiaridade com o uso da mão contrária.

Da mesma forma, pegadas ou marcas de deslocamento corporal em cenas de crime podem revelar padrões irregulares de movimento quando o criminoso tenta simular uma lateralidade oposta.

Em muitos casos, os criminosos falham em manter a coerência entre as evidências deixadas na cena.

Enquanto podem tentar manipular algumas evidências físicas, como o uso de uma mão não dominante para realizar um ataque ou manipular objetos, outros aspectos do comportamento natural, como escrever uma mensagem ou movimentar certos objetos, podem trair sua verdadeira lateralidade.

Assim, a comparação entre diferentes tipos de vestígios torna-se uma ferramenta poderosa para os peritos, que conseguem identificar inconsistências nas tentativas de dissimulação.

Lateralidade e Padrões de Movimentação Corporal na Cena do Crime

Outro aspecto importante relacionado à lateralidade manual é como ela influencia os padrões de movimentação corporal durante a execução de um crime.

Em crimes que envolvem confrontos físicos, como homicídios, o posicionamento do corpo do agressor e da vítima pode fornecer informações valiosas.

Quando um indivíduo destro está frente a frente com a vítima, os golpes tendem a atingir principalmente o lado esquerdo do corpo da vítima, já que o agressor, usando sua mão direita dominante, direciona os ataques de seu lado direito para o lado oposto da vítima.

Essa preferência por um lado ao golpear ou segurar a vítima gera padrões específicos de deslocamento e contato, como a distribuição de marcas de contusão ou escoriações em regiões particulares do corpo da vítima.

Um agressor canhoto, por sua vez, tenderia a atingir principalmente o lado direito da vítima ao se posicionar frente a frente. Esses padrões são cruciais para os peritos ao tentar determinar a lateralidade do agressor e reconstruir a dinâmica do ataque.

Esses padrões também podem ser observados em crimes que envolvem estrangulamento, onde a distribuição da pressão aplicada no pescoço da vítima pode indicar qual mão foi utilizada para realizar o ato.

A perícia pode analisar o tipo de lesão, sua localização e a força exercida, levando em consideração as limitações físicas de quem utilizou a mão não dominante ou a mão dominante.

O ângulo e a profundidade das lesões são, portanto, indicadores relevantes para a identificação da lateralidade e podem ser cruciais para a reconstituição da dinâmica do crime.

A Influência da Lateralidade na Manipulação de Armas e Ferramentas

Além do impacto nos padrões de golpes e confrontos físicos, a lateralidade manual também se reflete no uso de armas e ferramentas durante a execução de crimes.

A perícia criminal frequentemente se depara com a necessidade de identificar se uma arma branca, uma ferramenta ou uma arma de fogo foi manuseada pela mão dominante ou não dominante do agressor.

Isso pode ser determinado pela análise das marcas de uso, do desgaste, do posicionamento dos objetos na cena e das características das feridas infligidas.

Por exemplo, em crimes que envolvem o uso de facas ou outros objetos perfurantes, a direção e a profundidade dos ferimentos podem indicar não apenas a mão dominante, mas também a postura do agressor e sua proximidade da vítima.

Ferimentos profundos e precisos, especialmente em regiões vitais, são mais comuns quando a mão dominante é utilizada, enquanto feridas superficiais ou desajeitadas podem sugerir o uso da mão não dominante, que é menos hábil em exercer controle e força suficientes.

Adicionalmente, a trajetória dos golpes pode ser reveladora: cortes diagonais que seguem um padrão descendente da direita para a esquerda, por exemplo, são típicos de agressores destros.

Já no caso de armas de fogo, a lateralidade pode ser determinada pelo exame da posição do atirador, da arma e dos cartuchos de bala e projéteis.

Pistolas e revólveres ejetam os cartuchos de forma lateral, o que significa que, após o disparo, os cartuchos tendem a ser encontrados à direita do atirador em armas projetadas para destros.

Em investigações de cenas de crime, esse detalhe pode ajudar a determinar a mão dominante do atirador, principalmente quando combinados com a análise da trajetória do projétil e a posição relativa entre o atirador e a vítima.

Além disso, marcas de desgaste em armas de fogo, como aquelas deixadas pelo uso frequente do gatilho, também podem fornecer pistas valiosas sobre a mão dominante do atirador.

Se o desgaste é mais evidente no lado esquerdo de uma pistola, isso pode sugerir o uso prolongado da mão esquerda para segurar a arma, revelando assim a lateralidade do suspeito.

Movimentação de Objetos e Marcas Forenses Associadas

Outro aspecto técnico relevante é a análise dos objetos manipulados na cena do crime. Criminosos muitas vezes deslocam objetos importantes na tentativa de alterar a narrativa dos eventos.

No entanto, a maneira como esses objetos são movidos ou manipulados também pode trair a lateralidade do indivíduo. Impressões digitais, marcas de contato e até pegadas podem conter indícios claros de qual mão foi utilizada.

Por exemplo, uma pessoa destra ao tentar abrir uma gaveta com a mão direita pode deixar impressões digitais mais profundas ou visíveis no lado direito da gaveta, devido à aplicação de mais força e controle motor.

Da mesma forma, a localização de marcas de contato em móveis ou outros objetos pesados pode indicar a lateralidade de quem os deslocou. A disposição dos objetos ao redor da cena e o padrão de desordem criado durante a manipulação dos itens podem sugerir se o autor era destro ou canhoto, e isso pode ser crucial na exclusão ou inclusão de suspeitos.

Em crimes que envolvem a movimentação de corpos, a lateralidade também desempenha um papel importante. O deslocamento de um corpo exige força, e a forma como o criminoso posiciona suas mãos para segurar a vítima pode deixar marcas distintas de compressão ou abrasão. A perícia pode, então, comparar essas marcas com a lateralidade presumida do agressor para reconstruir a sequência dos eventos.

Psicologia e Neurociência da Lateralidade na Cena de Crime

Além das evidências físicas, é importante considerar o impacto psicológico da lateralidade no comportamento criminal. Estudos neurocientíficos sugerem que a lateralidade não afeta apenas o controle motor, mas também pode influenciar a tomada de decisões e a forma como o indivíduo interage com o ambiente ao seu redor. O cérebro humano é lateralizado, o que significa que diferentes funções cognitivas estão distribuídas entre os dois hemisférios. Para destros, o hemisfério esquerdo tende a ser dominante, controlando não apenas a mão direita, mas também habilidades como linguagem e raciocínio lógico. Para canhotos, essa dominância pode ser inversa ou mais distribuída entre os hemisférios.

Essa divisão funcional pode influenciar o comportamento do criminoso ao planejar ou executar um crime, uma vez que o lado dominante do cérebro está mais associado a processos analíticos ou emocionais. Por exemplo, um criminoso destro pode agir de forma mais metódica e organizada ao manusear uma arma ou ao lidar com uma vítima, enquanto uma pessoa canhota pode adotar estratégias diferentes, influenciadas pelo lado do cérebro que é mais ativo durante a execução do crime. Esse tipo de insight pode ajudar os peritos não apenas a determinar a lateralidade do suspeito, mas também a entender seu modus operandi e seu perfil psicológico.

A Importância de Considerar a Lateralidade em Crimes Não Premeditados

Em crimes não premeditados, o papel da lateralidade se torna ainda mais evidente, já que o criminoso age por impulso, sem tempo ou intenção de disfarçar seus movimentos ou ações.

Em situações de ataque súbito ou briga, os instintos dominam, e o agressor recorre automaticamente à sua mão dominante para golpear, empurrar ou estrangular a vítima.

Esse uso automático da lateralidade, sem tentativa de mascará-la, facilita a identificação do autor por parte dos investigadores.

Os vestígios deixados, como marcas de luta, feridas ou a distribuição de objetos caídos, refletem a lateralidade natural do agressor, permitindo uma reconstituição mais precisa da cena.

Além disso, criminosos que tentam alterar a cena após o crime geralmente se concentram em aspectos mais evidentes, como limpar sangue, esconder armas ou mover o corpo, mas ignoram detalhes relacionados à lateralidade. Ao usar a mão dominante para realizar essas tarefas, eles acabam deixando vestígios que indicam sua lateralidade.

Em muitos casos, o criminoso tenta forjar uma situação, como um roubo, movendo objetos ou manipulando móveis, mas o padrão de força e a disposição dos objetos traem a lateralidade do indivíduo. Esses erros, que podem passar despercebidos para o leigo, são fundamentais para a perícia criminal.

A movimentação de corpos, como já mencionado, é um exemplo claro dessa dinâmica. A forma como o criminoso segura ou levanta a vítima, combinada com a lateralidade, pode deixar marcas de força diferentes em cada lado do corpo, o que revela a mão dominante do agressor.

Mesmo em crimes não premeditados, onde o criminoso age por impulso e posteriormente tenta alterar a cena de maneira improvisada, essas marcas são indícios importantes que os peritos podem utilizar para identificar inconsistências e rastrear o comportamento do autor.

O Papel da Lateralidade na Dinâmica de Manipulação de Cenas de Crime

Quando os criminosos tentam manipular a cena de um crime, a intenção é quase sempre desviar a atenção da perícia para uma explicação diferente dos eventos ocorridos.

No entanto, ao não considerar a lateralidade, eles criam uma discrepância entre a simulação e a verdadeira dinâmica dos fatos. Um exemplo clássico é a tentativa de fazer parecer que um crime violento, como um homicídio, foi na verdade um roubo.

Ao mover objetos ou rearranjar itens na cena, o criminoso frequentemente usa sua mão dominante sem se dar conta de que essa ação deixa um rastro.

Marcas de impressão digital, pegadas e até mesmo a forma como os objetos são movidos, como já discutido, indicam a lateralidade do indivíduo. Em certos casos, os criminosos tentam imitar o comportamento de uma pessoa com a mão oposta à sua dominante, mas essa tentativa quase sempre é falha.

O uso da mão não dominante, especialmente em situações de estresse, resulta em movimentos mais desajeitados e menos precisos, deixando um padrão de manipulação facilmente detectável pela perícia.

Além disso, a simulação de uma cena de crime muitas vezes exige rapidez, o que faz com que o criminoso recorra instintivamente à sua mão dominante, inadvertidamente revelando sua identidade.

Em resumo, a lateralidade manual, embora muitas vezes subestimada ou ignorada, é um fator crucial na análise de cenas de crime.

Ela influencia não apenas a forma como o criminoso comete o ato, mas também como tenta alterar a cena para enganar a perícia.

A análise dos vestígios deixados pela lateralidade do agressor, como marcas de força, feridas e a manipulação de objetos, permite que os peritos reconstruam a dinâmica dos eventos de maneira mais precisa e identifiquem erros que os criminosos cometem ao tentar encobrir seus rastros.

Em crimes premeditados ou não premeditados, a lateralidade se manifesta de forma natural nos vestígios deixados pelo criminoso.

Assim, a atenção a esse aspecto na investigação forense oferece uma vantagem crucial para a resolução de casos, complementando outras análises técnicas como a de manchas de sangue, traços de DNA e impressões digitais.

A inclusão da lateralidade na construção de perfis criminais e na análise das cenas de crime contribui para uma investigação mais detalhada e para a formulação de hipóteses mais consistentes.

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Karol Cestari

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