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Educação: duas ruas e uma esquina.

Perguntamos muitas vezes: o que é educação? Reflito muito sobre essa pergunta durante os anos que venho trabalhando como professora, consultora educacional, microempreendedora, sendo mãe, e, mais recentemente, avó.

Quero conversar sobre isso, pois talvez esta seja uma pergunta que você faça, de vez em quando, com maior ou menor ansiedade. Não estou comentando, aqui, a educação como sinônimo de gentileza ou cortesia, que é também muito importante, e, em nossos dias um artigo de primeira necessidade, porém raro.

A educação, como ato da vontade humana, pode ser vista de algumas formas. Escolhi três delas para visualizarmos o processo educacional numa conversa em família.

Uma das formas possíveis é vermos o processo educacional como uma força exercida de fora para dentro que imprime, nos mais jovens, os padrões esperados para um convívio em uma vida ajustada e adequada ao que se anseia de melhor para eles. A educação existe por ser a perpetuação da humanidade e pela esperança de que esta humanidade se desenvolva conforme o desejado.

Nessa direção, a educação é pensada como um modo de assegurar um modelo previsto e avaliado, satisfatoriamente, pela família e pela sociedade.  A função da conservação, aqui, está bem acentuada e os filhos serão formados e modelados de acordo com nossas certezas, embora, hoje, essas não estejam tão presentes em nossas vidas.

Muitos de nós agimos dessa maneira sempre, ou, em algumas ocasiões. Ao trazermos os padrões estabelecidos e consolidados da sociedade, ou, quando incutimos valores que consideramos permanentes, estamos dentro dessa visão de educação. A escola mais tradicional, com princípios claros de disciplina e de autoridade, geralmente, é a escolhida pela família. Desde cedo, busca-se a preparação para um vestibular futuro e para o exame de ensino médio.

O processo educacional pode ser mais rígido ou mais flexível. Podemos conhecer, individualmente, a criança e o adolescente, sabendo de suas características, mas estamos cientes de que todos se tornarão adequados ao modelo que está dentro de nós para assegurar a sua felicidade e a nossa tranquilidade.

Agimos como disciplinadores para se chegar ao modelo ideal. Haverá um acompanhamento com o intuito de que as metas sejam cumpridas e o que foi traçado pela família, ou por um membro dela, deva ser alcançado.

Uma outra abordagem para a educação é vê-la como um “deixar-se fazer”. Nenhum pai ou mãe afirmaria que está assumindo esta visão, mas na realidade muitos de nós a adotamos quando descarregamos todas as atividades e responsabilidades pela educação dos filhos às escolas, aos clubes, aos cursos livres, às igrejas e a outras organizações que prestam serviço e preenchem o tempo do jovem.

Isso parece nos iludir de que estamos no caminho certo do processo educacional, pois o menino e a menina irão saber fazer tantas coisas que poderão competir melhor com outros da mesma idade e até com crianças mais velhas também. É um investimento de tempo e dinheiro, no entanto, sem muito retorno para a criança, pois todas as suas atividades não se integram entre si e não desenvolvem o seu projeto pessoal.

Abrem-se gavetas e mais gavetas na cabeça das crianças e informações são colocadas dentro. Frequentam muitas horas de atividades semanais de forma automática e inclusive estressante que podem aumentar a irritabilidade e a desconcentração. Habilidades são adquiridas, mas não chegam a se transformar em hábitos de vida ou em atitudes assumidas pelas crianças e adolescentes. E as decisões da família são exclusivamente de escolha dos agentes e locais sendo que o processo educacional ocorre por contratos nos âmbitos escolar e extraescolar.

O “currículo” da criança e do adolescente cresce em quantidade, mas a qualidade fica ausente devido à falta de integração e conexão entre as diversas áreas que se perdem no tempo e espaço. A escola poderá ser qualquer uma porque as atividades complementares é que farão a diferença para nossos filhos.

Há ainda um terceiro modo de vermos o processo educacional que é o despertar do que existe dentro do jovem aprendente. Educação de dentro para fora. Em quais aspectos ele tem o gosto diferenciado? O que a desperta para buscar mais e conhecer melhor? Onde está sua curiosidade na vida, o seu tipo preferido de lazer, qual a forma de se relacionar com os amigos, quais são os seus desejos e seus potenciais? Tudo isso, unido e conectado, cria a educação significativa com a descoberta das oportunidades junto com cada um dos filhos.

Há sempre ricos aprendizados que a escola oferece, mas cada escola tem uma abordagem diferenciada para a entrega do conteúdo previsto. É importante a escolha pela família, não para perpetuar sua história, mas para atender a diversidade de cada criança. Havendo a observação atenta dos pais sobre seu filho e sua filha, desde muito pequenos, a sua própria intuição acertará na escolha do local especial a cada um, onde passará tantos meses, dias e horas de suas vidas.

Se essa escolha for significativa para cada criança, a escola poderá servir para um filho e para outro teremos que buscar uma escola diferente. Isso porque escola não é como um sapato que pode ser colocado em vários pés, desde que tenha o mesmo número ou um tamanho aproximado.

Cada criança é um ser especial com suas características próprias e seria desejável atender a essas diferenças. Isso pode acarretar dificuldades de várias ordens aos pais? Sem dúvida: de levar e de trazer, de se organizar para as demandas de cada escola, atender aos horários diferenciados, participar de atividades complementares escolhidas pelos filhos entre as oferecidas nas escolas… São muitos os obstáculos para realizarmos tal processo educacional. Mas ele poderá ser a nossa utopia. O horizonte a ser seguido, admitindo-se adaptações e ajustamentos, mas sempre orientando o nosso caminhar.

No entanto, cada vez mais a vida urbana e empreendedora das mães e dos pais conduz para as outras duas formas de percebermos e agirmos em educação.

Famílias mais tradicionais preferem o modelo externo para a condução do processo, como tendência geral. Famílias mais modernas preferem as atividades extras, fora da escola, muitas vezes seguindo a moda do momento ou os desejos frustrados dos pais. Famílias mais conectadas despertam sua atenção para a terceira abordagem, buscando a personalização de projetos para cada filho.

Na prática, todos nós demonstramos comportamentos das três famílias: conservamos princípios, transferimos responsabilidades e desenvolvemos projetos. Temos algumas certezas sobre o futuro e o presente de nossas crianças e adolescentes, decidimos dar a eles atividades que complementem a escola, e, desejamos que todos desenvolvam seus potenciais.

Mas o horizonte que orienta cada uma das visões é diferente. É ele que vai definir a intenção que pretendemos dar ao processo, a partir do que mais acreditamos e expressa nossa vontade através do ato educacional.

Não há uma direção melhor do que a outra sem a análise de cada contexto familiar. Cada uma das visões trazidas em nossa conversa revela ênfases peculiares, a partir de ideias que inspiram as famílias.

Todas as famílias desejam o melhor para seus filhos e dentro de suas características estarão sempre lidando com dois polos que chamo de “duplo trajeto da educação”.

Qual o trajeto? Temos uma esquina formada por duas ruas. Elas se cruzam e formam o local do encontro. A rua da Liberdade e a rua da Segurança.

Quanto mais se trafega na rua da Segurança mais nos afastamos da Liberdade e podemos até ter a rua bloqueada. O contrário acontece também: com o maior trânsito na Liberdade podemos chegar ao abandono da Segurança. Por isso, a esquina é essencial ao encontro educacional. As três visões apontadas terão que transitar neste trajeto, continuamente, em todas as fases das vidas dos aprendentes.

Foto: Arquivo de família EUA
Foto de Christine Borgato: (arquivo de família EUA)

E aí se encontra a grande complexidade de qualquer ato da vontade humana. A Segurança nos dá Raízes e a Liberdade nos proporciona Asas. Somos terra e ar na Escola da Vida. É preciso frequentar sempre a esquina dessas ruas para obter o equilíbrio no processo educacional.

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Corina Ramos

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