Desafios periciais na análise do impacto psicológico familiar
Avaliação psicológica em casos de alienação parental exige critérios rigorosos para identificar manipulação emocional e proteger vínculos afetivos.
O presente artigo tem como objetivo demonstrar a importância do psicólogo forense no que diz respeito a avaliação psicológica no contexto da alienação parental, um fenômeno complexo que permeia o contexto das disputas judiciais envolvendo a guarda de menores.
A alienação parental caracteriza-se pela tentativa de um dos genitores de desqualificar o outro perante a criança, levando à ruptura do vínculo afetivo entre eles. Tal fenômeno, embora seja amplamente discutido em contextos jurídicos e psicossociais, carece de um rigor científico na conceituação de sua suposta síndrome, comumente denominada Síndrome de Alienação Parental (SAP).
A SAP, embora mencionada frequentemente em laudos e pareceres, não possui reconhecimento formal nos manuais diagnósticos vigentes, como o DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) ou o CID-10 (Classificação Internacional de Doenças), sendo, portanto, uma entidade diagnóstica controversa.
Neste contexto, o papel do psicólogo se torna central, uma vez que cabe a este profissional a responsabilidade de conduzir avaliações imparciais, objetivas com o intuito de identificar a ocorrência ou não de alienação parental.
A avaliação psicológica, deve priorizar a produção de informações técnicas que possam subsidiar decisões judiciais, distanciando-se de abordagens terapêuticas. Assim, um dos principais desafios enfrentados pelo psicólogo é garantir que a análise seja conduzida de maneira neutra e embasada, evitando qualquer viés que possa comprometer a objetividade do laudo.
Adicionalmente, cabe tanto ao advogado quanto ao psicólogo um papel crítico no que diz respeito à condução do processo que envolve uma avaliação psicológica.
No caso do psicólogo, é imprescindível que ele mantenha uma postura absolutamente imparcial durante a avaliação, evitando inclinar-se em favor de um dos lados do conflito familiar.
Muitos profissionais, por vezes influenciados pela narrativa de uma das partes, podem inadvertidamente aderir à versão apresentada, comprometendo assim a objetividade de sua avaliação e contribuindo para a perpetuação da alienação parental.
A não utilização dos instrumentos imprescindíveis poderá comprometer o trabalho realizado pelo psicólogo, o que compromete a eficácia de sua função técnica e imparcial.
Diante disso, este artigo busca abordar a importância de uma atuação imparcial tanto por parte do psicólogo forense quanto do advogado, destacando os riscos e as consequências da alienação parental quando não identificada ou tratada adequadamente.
Serão discutidos os principais aspectos teóricos e metodológicos que norteiam a avaliação psicológica em casos de alienação parental, com especial atenção à possível suspeição que pode impactar diretamente a imparcialidade e a validade das avaliações realizadas pelos profissionais envolvidos.
Além disso, serão apresentadas orientações práticas para operadores do direito e psicólogos no sentido de garantir que suas condutas estejam alinhadas às exigências éticas e científicas, assegurando a eficácia das avaliações psicológicas e a proteção dos direitos da criança.
A alienação parental, enquanto conceito, começou a ganhar relevância a partir dos estudos realizados pelo psiquiatra norte-americano Richard A. Gardner na década de 1980. Gardner propôs a ideia da Síndrome da Alienação Parental (SAP) em 1985, em um contexto de disputas de guarda de crianças após separações e divórcios conturbados.
Ele observou que, em algumas situações, um dos genitores manipulava a criança, influenciando-a negativamente contra o outro genitor, com o intuito de romper ou enfraquecer o vínculo entre eles.
Gardner descreveu a alienação parental como um fenômeno no qual a criança passa a rejeitar, sem justificativas adequadas, o genitor alvo de alienação, devido à manipulação emocional e psicológica exercida pelo outro genitor, chamado de genitor alienador.
Ele sugeriu que a SAP fosse tratada como uma condição patológica que justificaria intervenções tanto psicológicas quanto jurídicas, sendo, em alguns casos, necessário modificar a guarda da criança para o genitor alienado.
Controvérsias e críticas: Embora Gardner tenha sido o primeiro a propor a ideia de uma síndrome associada à alienação parental, seu conceito de SAP gerou grande debate e continua sendo um tema controverso.
A SAP não foi aceita nos principais manuais diagnósticos de saúde mental, como o DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) ou o CID-10 (Classificação Internacional de Doenças), por falta de evidências científicas robustas que comprovassem sua validade como uma síndrome clínica.
Críticos argumentam que a SAP patologiza comportamentos que podem ser explicados por outros fatores e que a manipulação de crianças em disputas de guarda não deve ser vista exclusivamente como uma questão clínica, mas também como um problema de dinâmica familiar e de relações de poder.
Evolução e reconhecimento legal: Apesar das controvérsias em torno da SAP, a alienação parental, como conceito comportamental, foi amplamente reconhecida em contextos jurídicos e sociais.
Muitos tribunais ao redor do mundo passaram a reconhecer a alienação parental como um fator relevante em disputas de guarda, ainda que o termo “síndrome” tenha sido abandonado na maioria dos contextos por não ter respaldo científico formal.
Em países como o Brasil, a alienação parental foi formalmente reconhecida pela Lei nº 12.318, de 2010, que define e penaliza atos de alienação parental. Essa legislação descreve a alienação parental em seu Art.2° considera ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou a manutenção de vínculos com este.
A alienação parental, então, emergiu inicialmente no campo da psicologia e psiquiatria forense, mas, ao longo das décadas, tornou-se um tema interdisciplinar que envolve psicologia, direito, e mediação familiar.
A Síndrome da Alienação Parental (SAP), quando presente, pode gerar uma série de consequências comportamentais e emocionais nas crianças envolvidas. Esses impactos resultam da manipulação psicológica promovida pelo genitor alienador, o que interfere diretamente na percepção da criança em relação ao genitor alienado.
Crianças expostas à alienação parental podem manifestar reações negativas, a exemplo da rejeição infundada e hostilidade injustificada.
A Síndrome da Alienação Parental, conforme citado por Fonseca (2007), refere-se a um conjunto de sequelas emocionais e comportamentais manifestadas por crianças que, de maneira veemente, recusam-se a estabelecer qualquer contato com um dos progenitores.
Essa condição é decorrente da alienação parental, que se caracteriza pelo afastamento do filho em relação a um dos genitores, provocado por atitudes e comportamentos do outro genitor.
Essa dinâmica pode ter implicações significativas no desenvolvimento emocional e psicológico da criança, evidenciando a necessidade de intervenções adequadas para mitigar os efeitos adversos dessa condição.
Diante das complexidades inerentes à alienação parental, é evidente que a realização de avaliações psicológicas rigorosas é crucial para o contexto jurídico.
A interação efetiva entre psicólogos e operadores do direito emerge como uma necessidade premente, uma vez que essas avaliações não apenas identificam a presença de alienação parental, mas também informam decisões judiciais que afetam o bem-estar da criança.
A colaboração entre essas partes assegura que as intervenções sejam baseadas em dados precisos e que as necessidades emocionais e psicológicas das crianças sejam priorizadas nas deliberações judiciais.
Portanto, a importância da avaliação psicológica se torna um pilar essencial para garantir a proteção dos direitos da criança e promover decisões justas e informadas no âmbito da guarda.
Avaliação psicológica
As demandas que envolvem os direitos da criança e do adolescente requerem a atenção diligente de todos os profissionais envolvidos, sendo fundamental considerar o lugar de fala da criança.
Contudo, no âmbito dos processos judiciais, os menores são frequentemente representados por seus genitores, especialmente por aqueles que exercem a guarda unilateral. Nessas circunstâncias, torna-se necessário seguir um procedimento específico determinado pela autoridade judicial.
O procedimento mais frequentemente adotado consiste na realização de uma avaliação psicológica
Segundo Primo (2010, p. 26),
“a avaliação psicológica é uma atividade mais complexa e constitui-se na busca sistemática do conhecimento a respeito do funcionando psicológico das pessoas, de tal forma a poder orientar ações e decisões futuras”.
Já na fase do processo em que se garante aos genitores todo o direito a ampla defesa e ao contraditório a participação de peritos especializados é fundamental como se pode depreender no disposto dos artigos 167 e o 168 do ECA
Embora muitos litigantes aleguem a ocorrência de alienação parental durante os processos judiciais, é imprescindível ressaltar que a confirmação dessa alegação demanda uma avaliação psicológica rigorosa e apropriada.
A simples afirmação de que um dos genitores está alienando a criança não é suficiente para fundamentar uma intervenção judicial eficaz; é necessário fornecer evidências concretas que comprovem essa dinâmica.
A avaliação psicológica desempenha um papel crucial nesse contexto, uma vez que é a única forma capaz de identificar e validar a existência de alienação parental. Para tal, o psicólogo utiliza uma variedade de instrumentos e metodologias que permitem uma análise profunda do comportamento e das interações da criança com ambos os genitores.
Durante o processo avaliativo, a criança pode ser solicitada a realizar desenhos ou contar histórias, atividades que frequentemente revelam suas percepções e sentimentos em relação aos genitores.
Um aspecto significativo observado pelo psicólogo é a tendência da criança em ignorar ou omitir referências a um dos genitores durante essas atividades. Essa atitude pode ser um indicativo de alienação parental, pois reflete a influência negativa que um dos genitores pode estar exercendo sobre a criança, levando-a a distanciar-se emocionalmente do outro.
Quando a criança não menciona ou retrata o genitor alienador, isso pode sinalizar um padrão de desvalorização que é muitas vezes sutil, mas que requer uma análise atenta para ser devidamente identificado.
Dessa forma, é essencial que os advogados, ao se depararem com alegações de alienação parental, compreendam que a prova dessa dinâmica não se baseia apenas em relatos subjetivos ou sentimentos de um dos genitores.
A única maneira de apresentar um argumento sólido perante o judiciário é por meio de uma avaliação psicológica adequada, que permita evidenciar as consequências da alienação parental no funcionamento emocional e comportamental da criança.
Portanto, a atuação do psicólogo, com uma abordagem técnica e imparcial, é fundamental para a construção de um laudo que possa realmente informar as decisões judiciais, assegurando que a proteção e o bem-estar da criança sejam prioritários
É crucial considerar que o uso indevido do sistema judiciário para alegar alienação parental sem a devida comprovação pode levar a consequências legais significativas. A jurisprudência tem demonstrado que os tribunais estão cada vez mais atentos a situações em que as alegações de alienação parental são apresentadas sem fundamentação robusta.
Nesse contexto, a litigância de má-fé refere-se ao ato de utilizar o judiciário como um instrumento de vingança ou manipulação, desvirtuando o verdadeiro propósito da justiça.
O magistrado enfatizou que as alegações infundadas de alienação parental não apenas comprometem a credibilidade do processo judicial, mas também podem causar danos irreparáveis ao relacionamento da criança com o genitor acusado.
Portanto, para que uma alegação de alienação parental tenha validade no âmbito judicial, é imprescindível que seja acompanhada de uma avaliação psicológica criteriosa, realizada por um perito capacitado.
A jurisprudência reafirma que o ônus da prova recai sobre a parte que alega a ocorrência de alienação parental, e, na ausência de evidências claras e objetivas, o tribunal pode considerar as alegações como abusivas.
Isso não apenas protege o direito do genitor acusado, mas também resguarda o bem-estar da criança, evitando que ela seja submetida a um processo que pode agravar a sua situação emocional e psicológica.
A análise da estrutura psicológica em casos de alienação parental é um processo intrinsecamente complexo, que demanda um olhar atento e criterioso por parte do psicólogo responsável pela avaliação.
A natureza multifacetada da psicologia exige que o profissional utilize uma variedade de metodologias e técnicas para assegurar que a avaliação seja abrangente e precisa. Caso o psicólogo não realize essa análise de forma meticulosa, a avaliação pode ser considerada incompleta e, consequentemente, o laudo produzido poderá falhar em refletir a realidade da situação em questão.
Ao longo do artigo, foram discutidos os riscos da alienação parental, as consequências emocionais e comportamentais que ela pode gerar nas crianças, e a necessidade de que alegações de alienação parental sejam sustentadas por evidências sólidas oriundas de avaliações psicológicas adequadas.
Abordagens da avaliação psicológica
A avaliação psicológica desempenha um papel crucial na identificação de casos de alienação parental. Ao afirmar que a alienação parental está presente, é fundamental que se utilize uma metodologia rigorosa que leve em consideração diversos aspectos do desenvolvimento psicológico da criança.
Profissionais devem estar atentos aos sinais que a criança apresenta, como a recusa em manter contato com um dos genitores, bem como comportamentos que podem indicar a influência de um dos pais sobre suas percepções.
As ferramentas utilizadas na avaliação psicológica, como entrevistas, testes psicológicos e observações diretas, devem ser cuidadosamente selecionadas para proporcionar um entendimento abrangente da dinâmica familiar.
Sem uma avaliação minuciosa, corre-se o risco de rotular erroneamente situações complexas como alienação parental, o que pode ter repercussões significativas para todos os envolvidos, especialmente para a criança.
Consequências da Alienação Parental e a Necessidade de Intervenção
As consequências da alienação parental para a saúde emocional e psicológica da criança são profundas e duradouras. Crianças que são alvo de alienação parental podem desenvolver uma série de problemas emocionais, incluindo ansiedade, depressão e dificuldades de relacionamento interpessoal.
Tais sequelas não apenas afetam o bem-estar da criança no presente, mas também podem se manifestar em problemas de adaptação na vida adulta, como dificuldades em estabelecer vínculos saudáveis e problemas de autoestima.
Portanto, a identificação precoce da alienação parental e a intervenção adequada são fundamentais. Os profissionais envolvidos, incluindo psicólogos e advogados, devem trabalhar em conjunto para desenvolver estratégias que promovam a restauração do vínculo entre a criança e o genitor alienado, sempre priorizando o bem-estar da criança e buscando minimizar o impacto emocional negativo da alienação.
Relevância Prática e Sugestões para Pesquisas Futuras
A relevância prática deste estudo se reflete na necessidade de uma abordagem multidisciplinar na gestão de casos de alienação parental. A colaboração entre advogados e psicólogos é essencial para garantir que as questões legais e emocionais sejam abordadas de forma integrada.
Além disso, o compartilhamento de informações e a formação contínua dos profissionais em temas relacionados à alienação parental podem melhorar significativamente a qualidade das intervenções realizadas.
Em termos de futuras pesquisas, é essencial explorar mais profundamente as dinâmicas familiares que levam à alienação parental e o impacto a longo prazo nas crianças afetadas.
Estudos longitudinais poderiam fornecer insights valiosos sobre a evolução do comportamento e da saúde mental das crianças após intervenções apropriadas. Também seria benéfico investigar a eficácia de diferentes métodos de avaliação psicológica em casos de alienação parental, buscando identificar quais abordagens são mais eficazes na identificação e tratamento desse fenômeno.
Por fim, é fundamental que os profissionais envolvidos mantenham um compromisso ético em suas atuações, assegurando que a busca pelo melhor interesse da criança prevaleça sobre conflitos pessoais. O fortalecimento da colaboração entre advogados e psicólogos pode contribuir significativamente para a resolução de casos de alienação parental, promovendo um ambiente mais saudável e justo para todas as partes envolvidas.
Escritora científica pelo ORCID (Open Researcher and Contributor ID)
Identificação Internacional, 0009-0001-2462-8682
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